segunda-feira, 28 de junho de 2010

Saudades da Bahia


Saudades da Bahia
[Patricia Montenegro]

Hoje amanheci com um gosto de saudade dentro de mim. Saudade de uma pequena parte da minha infância vivida na Bahia. Foi pouco tempo. Dos 3 aos 5 anos. E nessa fase da vida não temos uma memória completa. [A minha pelo menos] Portanto é uma saudade feita de ‘flashes’ porém não menos marcantes.
Nessa época meu pai militar da aeronáutica foi transferido para Salvador. Moramos em duas casas a primeira que pouco me recordo em Ondina e a segunda da qual tenho mais recordações na Barra.
Para uma criança pequena morar em uma casa é um presente. A sensação de liberdade é enorme. Foi lá que comecei as minhas primeiras brincadeiras de criança e fiz meus primeiros amiguinhos. Tanto na escola como os meus vizinhos. Um casal de irmãos, filhos de militares também, que eram meus melhores amigos.
Uma das coisas que mais me recordo de Salvador era o céu azul e límpido. O clima sempre agradável o que me possibilitava idas diárias a praia. Eu nem me importava com a hora da chuva. Tornou-se uma brincadeira fugir da chuva e depois de alguns minutos voltar a brincar na praia com o sol a nos brindar.
Lembro a primeira vez que cismei que tinha que comer um acarajé, que adoro até hoje, e lá fui eu de mãos dadas com minha mãe até o verdadeiro tabuleiro da baiana. Ela toda de branco, roupa limpa como a nuvem, tabuleiro todo arrumado, um convite à degustação. Ela então me olhou e perguntou: ‘quente’ ou ‘frio’? Na minha cabeça de criança carioca é claro que eu queria quente! E respondi com a maior segurança, antes que minha mãe pudesse intervir quente!
Bom quando mordi o acarajé descobri que o quente realmente fazia esquentar, mas por causa da pimenta! Foi a minha primeira lição. Cheguei a conclusão que o ideal era o acarajé ‘morno’.
Eu morava em uma casa confortável. Não era grande. Mas tinha um belo jardim na frente e um quintal nos fundos.
O quintal dos fundos da casa era onde eu brincava com o meu jipe verde. Fazia minhas manobras que me levavam a lindas viagens imaginárias. Eu não tinha muitos brinquedos. Mas o meu jipe me bastava. Era uma infância saudável sem essa loucura de vídeo games de luta de hoje em dia.
Na frente da casa tinha o jardim. Onde imperavam três belos coqueiros. Eram os ‘meus amigos’ especiais. Gostava de contar para eles as minhas aventuras, sonhos e medos. Eu achava que seus cocos eram seus filhos. E de uma certa forma eu não estava errada.
Pode parecer estranho conversar com coqueiros, mas na cabeça de uma criança existe lugar para a fantasia. E eu gostava de sentar em frente a eles (embaixo minha mãe não permitia, dizia que um coco poderia cair na minha cabeça) e mostrar meus desenhos, meus deveres da escola e contar para eles o meu dia. Era com eles que ficava quando estava triste também. Eles faziam parte da minha vida.
O dia festivo era o dia da coleta dos cocos. Os coqueiros ficavam repletos. E lembro da fila que se formava em frente a nossa casa para a distribuição dos cocos. Eu ficava feliz em ajudar a entregar os cocos e com a felicidade das pessoas.
Eu ficava feliz também porque sabia que naquele dia teria doce de coco! Como era gostoso. E beber a água de coco fresquinha.
Tenho saudades dos meus três amigos coqueiros.
Quando voltei há algum tempo a Salvador me deu uma certa nostalgia ver que a casa já não existia mais e nem meus amigos coqueiros.
Mas a imagem que quero guardar é a dos meus coqueiros firmes e fortes a me fazer companhia.
Essa casa foi testemunha de algumas peripécias minhas. Como a do gato que recolhi na rua e convenci a minha mãe a ficar com ele. Foi um longo discurso. Mas consegui fazer com que o gato ficasse. Depois de um bom banho e uma tigela de leite ele ficou forte e bonito. Batizei-o de marronzinho por causa da sua cor.
Marronzinho era um gatão fujão. Vivia dando suas escapulidas e me assustando. Mas acho que ele gostava da casa e de mim e sempre voltava. Ele ficou comigo até eu voltar ao Rio. Deixei-o com meus amiguinhos da casa em frente.
Outra saudade foi quando no final do ano no jardim de infância a escola presenteou todas as crianças com um pintinho. Lindo! Peludinho e amarelinho. Alegria geral das crianças e desespero das mães. Mas eu não abri mão de levar o amarelinho, nome com o qual batizei-o, para casa. Tivemos que arranjar uma gaiola para colocar o pinto e protege-lo do gato. Durante um tempo eles foram amigos. Mas um dia o pintinho sumiu. E apesar de não terem me contado, acho que o instinto do gato falou mais alto e ele matou o pintinho. Chorei muito. Mas passou. Afinal eu tinha um mundo de sonhos para viver.
Foi uma época feliz da minha vida. Foi um tempo tranqüilo em que eu vivia com uma certa liberdade de poder brincar nas ruas .Correr livremente sem medos.
Saudade das visitas ao farol da Barra.
Saudades dessa terra gostosa e amiga que é a Bahia que me acolheu em seus braços com tanto amor e simpatia do seu povo amigo.
Olho para trás e ainda vejo a criança inocente, de olhos brilhantes, sentada no muro da casa esperando o seu pai voltar do trabalho ou o baleiro e seu carrinho passarem.
Vejo a menina brincando com seu jipe e conversando com seus coqueiros..
Hoje amanheci assim..com saudades da Bahia, da minha infância e com saudades de mim...

Patricia Montenegro
26-05-04 – 18.05 horas.

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